
Assim, os ‘vícios construtivos’ podem ser as falhas, imperfeições e deformidades que podem vir a surgir na construção. Decorrem de erros na elaboração do projeto ou na execução da obra, inclusive quanto ao material aplicado e à ausência de informações sobre a utilização ou manutenção daquele imóvel.
No entanto, não são todos os problemas da construção que podem ser classificados como vício construtivo, pois podem ter como origem o decurso natural do tempo ou problemas advindos de mau uso ou falta de manutenção preventiva adequada.
Mas, e como realmente saber a origem do problema?
No Brasil, temos a NBR 13.752/96 que fixa diretrizes, conceitos e critérios para realização de perícias de engenharia na construção civil, padronizando os procedimentos e métodos a serem adotados nessas diligências, tornando mais segura a conclusão do profissional quanto à origem do problema, e assim, evitar discricionariedades ou até mesmo omissões.
Os vícios construtivos podem ser classificados em três tipos:
a) Vícios aparentes: podem ser percebidos a olho nu, sem auxílio de ferramentas ou necessidade de conhecimento técnico aprofundado. Podemos citar como exemplos, uma porta sem maçaneta, um revestimento trincado ou a falta de uma louça sanitária.
b) Vícios ocultos: não são percebidos a olho nu, geralmente por terem sido camuflados ou por surgirem apenas após determinado tempo de uso da coisa. Temos como exemplos o descolamento de revestimentos por mau assentamento, má projeção de um quadro elétrico ou entupimento de tubulação.
c) Vícios de segurança e solidez: a segurança e solidez de uma construção vão além do risco de ruína ou desmoronamento da edificação, e diz respeito também a todos os defeitos que podem tornar a construção perigosa de se habitar. Estão intimamente ligados às infiltrações generalizadas de água nos tetos e nas paredes, umidades significativas, perigos de incêndio, enfim, tudo aquilo que cause um dano estrutural ou à saúde dos moradores.
Agora que temos definidos os vícios construtivos, é importante trazer à conhecimento de que eles são espécies, enquanto, de uma forma mais ampla, existem as patologias construtivas, como gênero.
As patologias construtivas são estudadas por peritos e espelhadas em laudos, e visam determinar as causas e as consequencias dos problemas manifestados em uma construção.
Pela NBR 13.752/96, são quatro os tipos de patologia, e são caracterizadas principalmente pelas suas origens:
a) Patologia Endógena:é derivada de falhas internas na construção, como por exemplo, utilização de materiais inadequados ou de qualidade questionável, erros no planejamento ou execução da obra e inobservância das normas técnicas. É o popular vício construtivo.
b) Patologia funcional: são os problemas que decorrem da realização de manutenção inadequada no imóvel, ou, em alguns casos, pela sua ausência, reduzindo o tempo de vida útil dos sistemas construtivos. Na grande maioria das vezes, esse tipo de patologia é gerado pelos próprios usuários que não seguem as orientações de conservação da construção.
c) Patologia natural: provém de fenômenos da natureza, tais como tempestades, furacões, raios, ações climáticas prolongadas no tempo etc. ou seja, acontecimentos dissociados da interferência da ação humana.
d) Patologia Exógena: está ligada a danos causados por obras de vizinhos ou desconformidades dos imóveis confrontantes, ou seja, decorrem de ação humana externa.
GARANTIAS
A garantia legal de qualquer obra está inserta no artigo 618 do Código Civil:
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.
Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.
O marco inicial para a contagem do prazo de 5 anos da garantia é a emissão do “habite-se” do empreendimento, que é o atestado formal e oficial de que determinada obra foi concluída de acordo com o projeto arquitetônico previamente aprovado.
Um tanto quanto controverso é o entendimento quanto ao prazo prescricional para ingresso de ação judicial quanto ao vício constatado.
Nos casos em que não se aplica o CDC, há discussão quanto à aplicabilidade do prazo de 3 anos do artigo 206, §3º do CC, ou do prazo decenal previsto no artigo 205 do CC.
Aos que defendem o prazo prescricional de três anos, entende-se que o termo ‘reparação civil’, utilizado no artigo 206, §3º, inciso V do CC abrange tanto a responsabilidade contratual quanto a extracontratual (REsp 1281594/SP de 2017).
Por outro lado, o prazo decenal previsto no artigo 205 do Código Civil é defendido por aqueles que entendem que o legislador ao escrever o artigo 206, §3º, inciso V do CC quis abranger tão somente a responsabilidade extracontratual, não abarcando a responsabilidade civil decorrente dos contratos. No julgamento do EREsp 1281594/SP em 2019, o Relator Ministro Benedito Gonçalves entende que a prescrição é regra restritiva de direitos, e não pode ser interpretada de forma ampla. Ou seja, o prazo prescricional de três anos somente atingiria aqueles aos quais não estão resguardados por contrato. De outro lado, aos que estão amparados por instrumento contratual, maior é o lapso temporal para reivindicar judicialmente a quebra do contrato.
E quanto ao prazo de 180 dias do parágrafo único do artigo 618? Luiz Antonio Scavone Jr. Entende que somente poderá ser aplicado o prazo decadencial a uma ação desconstitutiva, ou seja, de resolução do contrato, jamais nas ações que visam à indenização (condenação) pelos danos decorrentes do inadimplemento contratual do construtor quanto à segurança e solidez da obra.
Em todas as hipóteses acima elencadas, o prazo para a reparação dos danos é contado a partir da constatação do vício.
No entanto, pode ser – e é mais provável que seja -, que a relação estabelecida pelo adquirente do imóvel e o construtor, seja de consumo.
Desta forma, estaremos diante de relação de consumo, regida pelo CDC. Aqui, pouco importa a existência de culpa ou dolo do fornecedor, desde que haja prova do dano, da ação ou omissão e o nexo causal.
São duas as espécies de mácula que atingem os produtos e serviços no CDC:
a) Vício por insegurança (defeitos) – art. 12 a 17 do CDC; e,
b) Vício por inadequação (vícios) – art. 18 a 25 do CDC.
Os vícios por insegurança, podem ser, dentro do âmbito da construção civil, considerados como aqueles capazes de provocar acidente de consumo, como por exemplo, a inadequação da fiação elétrica, rachaduras e infiltrações.
Já os vícios por inadequação, dizem respeito à incolumidade econômica do consumidor, e procuram proteger o patrimônio dele dos prejuízos relacionados com a qualidade e quantidade dos produtos introduzidos no mercado. Exemplos de vício por inadequação é a utilização de materiais diversos daqueles declarados pelo construtor em contrato, ausência de itens que integram o valor do bem, metragem diversa da estipulada em contrato.
PRAZOS DOS VÍCIOS POR INADEQUAÇÃO
Tratando-se de vício de qualidade e produto compósito, o fornecedor terá o prazo de 30 dias para sanar o defeito, ao fim dos quais o fornecedor poderá pedir a substituição imediata do produto por outro (obrigação de fazer), solicitar a restituição imediata do preço (resolução do contrato) ou o abatimento proporcional do preço (ação de indenização).
Agora, tratando-se de vício de quantidade e de produtos não compósitos, o consumidor não precisa aguardar os 30 dias para que o fornecedor sane o defeito, podendo requerer, diretamente a resolução do contrato, a substituição ou o abatimento no preço.
Nos vícios por inadequação (qualidade e disparidade com a oferta – CDC, art. 26) os prazos são os seguintes: 30 (trinta) dias para produtos não duráveis e 90 (noventa) dias para produtos duráveis, como é o caso dos imóveis. Ambos os prazos são contados a partir da entrega do produto ou do término da execução dos serviços. Se o vício for oculto, o prazo se inicia no momento em que o vício se evidenciar, se for aparente, da data da entrega (CDC, art. 26, § 1º).
Para os vícios ocultos, não é contado o prazo de garantia do artigo 618 do CC, de sorte que ficará para a análise do caso concreto a constatação da razoabilidade de se pleitear a responsabilização do construtor por aquele vício.
PRAZOS DOS VÍCIOS POR INSEGURANÇA
A regra prevista pelo artigo 27 do CDC é de que prescreve em cinco anos a pretensão à reparação dos danos, com início da contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
A fim de não ficar à mercê da sorte e do entendimento do juiz julgador da causa, existe a NBR 15575:2013, que dispõe normas de desempenho com o condão de fundamentar e orientar as atribuições dos agentes e as validades da garantia. É nessa normatização que se encontra o prazo de vida útil de cada sistema construtivo (estruturais, de piso, vedações, de coberturas e hidrossanitários).
Paralelo a tudo isso, é importante que o construtor/incorporador faça um trabalho preventivo em seus empreendimentos, sempre se resguardando e documentando todo o andamento da obra – inclusive na entrega e quando o imóvel já estiver habitado -, diminuindo drasticamente os riscos de ter que responder a processos indenizatório.
- Artigo publicado pela sócia Carla Giacomini