
Antes da alteração legislativa que regulamentou o condomínio de lotes – artigo 1.358-A do Código Civil, incluído pela Lei n. 13.465 de 2017, este instituto já vinha sido difundido no meio imobiliário, consistindo basicamente na mescla de loteamento (forma de parcelamento do solo) e condomínio edilício (espaço que une ambientes privados e ambientes de uso conjunto), e o embasamento para sua aplicação justificava-se no disposto do art. 3º do Decreto-lei n. 271/1967, que assim dispõe:
Art. 3º Aplica-se aos loteamentos a Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964, equiparando-se o loteador ao incorporador, os compradores de lote aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção da edificação.
§ 1º O Poder Executivo, dentro de 180 dias regulamentará este Decreto-lei, especialmente quanto à aplicação da Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964, aos loteamentos, fazendo inclusive as necessárias adaptações.
Nos condomínios de lote, abre-se a possibilidade de realizar uma incorporação imobiliária no loteamento, por meio da constituição do condomínio de lotes, não se exigindo que o empreendedor realize construção sobre o solo parcelado na modalidade de loteamento.
Apesar da inovação legislativa, ainda pairavam dúvidas quanto à possibilidade de incorporação imobiliária para os condomínios de lote, uma vez que não houve disposição expressa acerca da aplicação do instituto à essa nova modalidade de condomínio.
Em 27 de junho de 2022, foi publicada a Lei n. 14.382/2022, que trouxe diversos avanços para o direito imobiliário.
Dentre um deles, podemos citar a confirmação de que os condomínios de lotes são passíveis de incorporação imobiliária, mediante alteração da redação do artigo 1.358-A do Código Civil, e, por consequência, é possível instituir o patrimônio de afetação, lembrando que é necessário seguir o regramento dos condomínios edilícios nesse cenário.
Novas propriedades são criadas dentro do condomínio de lotes, devendo haver a reserva de áreas comuns ou de utilidade pública.
No caso de lotes integrantes de condomínio de lotes, poderão ser instituídas limitações administrativas e direitos reais sobre coisa alheia em benefício do poder público, da população em geral e da proteção da paisagem urbana, tais como servidões de passagem, usufrutos e restrições à construção de muros.
Acerca da legislação aplicável aos condomínios de lote, temos a aplicação da Lei 6.766/79, porque se trata de efetivo parcelamento do solo. Por regra geral, podem incidir também as regras da reurbanização (Reurb-E e Reurb-S).
Além disso, as alterações legislativas ocorridas em 2022 confirmam a necessidade de se observar as exigências da lei 4.591/64 relativamente à incorporação imobiliária e a certos requisitos que asseguram a característica privada do empreendimento a realizar, bem como as regras gerais estabelecidas pelo Código Civil.
Tudo isso, é claro, sem prejuízo das normas edilícias do município onde se dará o empreendimento.
A incorporação imobiliária para os condomínios de lotes era tema delicado e sem entendimento pacífico quanto à sua possibilidade. O sancionamento da Lei n. 14.382/2022 com certeza veio para trazer maior segurança jurídica ao empreendedor imobiliário, não deixando dúvidas de que essa modalidade de empreendimento é cabível a incorporação imobiliária, com regime especial de tributação (RET).
Não obstante a inovação legislativa, há entendimento de que ainda se aplica o artigo 3º do Decreto-lei n. 271-1967, o qual estabelece que aos loteamentos se aplica a Lei n. 4.591/64, equiparando-se o loteador ao incorporador, os compradores de lotes aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção de edificação. O entendimento não é predominante, mas pode e deve ser utilizado como fundamentação legal para viabilizar o empreendimento, principalmente aos loteamentos não vinculados aos condomínios de lotes.
Artigo publicado pela Dra. Carla Giacomini
∙ Advogada inscrita à OAB/PR 95.586 ∙ Bacharela em Direito | PUC/PR ∙ Especialista em Direito Empresarial e Agronegócio ∙ Especialista em Direito Imobiliário